O
que impede a representatividade de negros e negras na política? Bom, usualmente
o tema é abordado pela ausência de representatividade, diversidade e
pluralidade étnica. Nesta última década (2011-2020) a crise de
representatividade que ficou em destaque, foi a representação política, ou
seja, a relação de confiança entre eleitores e candidatos a prefeito,
governador, vereadores, deputados estaduais e federais, senadores e presidente.
Isso
ficou nítido a partir das jornadas de junho de 2013, com o questionamento
sistemático aos políticos profissionais. Essa crise de representação política, esconde
uma outra crise de representação. Qual seria? A crise de representação étnico-racial.
A
partir disso o sistema de representação política da democracia liberal guarda
em si, implicitamente e explicitamente formas de exclusão política que faz
fronteira com o racismo institucional. Silvio Almeida diz que o racismo
institucional se estabelece como um domínio, utilizando parâmetros
discriminatórios baseados na raça, que servem para manter a hegemonia do grupo
racial no poder. Nesse sentido, o racismo é dominação.
Do
ponto de vista institucional encontramos vários sintomas da exclusão política
de negros e negras da política representativa, para a manutenção de um padrão
político dominados por homens brancos.
Nas
eleições gerais de 1994 a 2010 para governador, deputados federais e estaduais,
senador e presidente da república, o sistema de dados da Justiça Eleitoral ao
tratar do perfil dos mesmos, não abordava as categorias raça/cor como forma de
definir o perfil dos candidatos, constituindo desse modo, omissão institucional
para sistematizar um banco de dados de candidaturas negras.
A
lacuna histórica acerca das candidaturas negras, não foi raio em céu azul. As
raízes dessa omissão institucional, é derivado das formas de sociabilidade
construídas em decorrência da herança colonial, escravocrata e latifundiária do
Brasil.
O
Tribunal Superior Eleitoral – (TSE) passou a contabilizar candidaturas negras
nas eleições gerais, somente a partir de 2014, tendo contabilizado também em
2018. No caso da Justiça Eleitoral, a
terminologia estabelecida para auferir o quantitativo de candidaturas na ótica
da raça/cor é: branco (a), pardo (a) e preto (a).
Em
2014 o Brasil registrou 26.174 candidaturas, sendo que apenas 84% foram
válidas, portanto, 21.899. O registro de candidaturas de pretos e pretas em
2014 no Brasil foi de 2.422, o que corresponde a 9,25%.
Pardos
tiveram 9.158 candidaturas (34,99%) e os brancos tiveram 14.377 candidaturas,
sendo a maior fatia do bolo, com 54,93% das candidaturas. Em 2018 o registro de
candidaturas foi de 29.085 candidaturas. O registro de candidaturas de pretos e
pretas em 2018 foi de 3.160, representando 10,86% do total. Pardos vem logo em
seguida com 10.368 registros de candidaturas, correspondendo a 35,7%. Os
brancos seguem mantendo o maior número de candidaturas, com 15.241
candidaturas, representando 52,4% do total.
Agora
fica um questionamento, e as candidaturas indígenas? Em 2014 foram somente 85
candidaturas indígenas, o que correspondeu na época a 0,05% do total. Nas
eleições de 2018 tivemos 133 candidaturas indígenas, o que representou 0,46% do
total.
Diante
do cenário nacional, como é que funciona a dinâmica das candidaturas de negros
e negras no Amapá? Vamos olhar os dados das eleições gerais de 2014 e 2018.
No
Amapá em 2014 tivemos 547 registros de candidaturas, sendo que 476 (87,02%)
forma consideradas aptas. As candidaturas de pretos e pretas somou 65 registros
válidos (11,88%) do total. Brancos tiveram 179 candidaturas (32,72%) e pardos
tiveram o maior índice, com 296 candidaturas (54,11%). As candidaturas
indígenas teve 3 registros válidos (0,18%).
Na
eleição de 2018 o cenário não mudou, seguimos com um número significativo de
candidaturas de pardos e pardas, sendo 381 candidaturas (57,47%) de um total de
563 registros válidos. Os brancos somaram 174 candidaturas (26,24%). Pretos e
pretas tiveram 103 candidaturas (15,54%). As candidaturas indígenas obteve 2
registros (0,3%).
O
que podemos tirar desses números?
1º)
O número de candidaturas de pardos e pardas a nível nacional não corresponde ao
nível local. Elas são inversamente proporcionais, sendo a nível nacional menor
e a nível local maior;
2º)
As candidaturas de pretos e pretas segue o mesmo padrão do nível nacional em
nível local;
3º)
Candidaturas indígenas segue uma sub-representação em nível local e nacional.
4º)
Os brancos em nível nacional ostentam os maiores números de candidaturas, correspondendo
diretamente no maior número de representatividade política, enquanto no nível local
o número de candidaturas brancas é menor, porém, o número de mandatos de
brancos é maior.
Na
Assembleia Legislativa do Amapá – (ALAP) em 2014 tivemos 11 pardos, 11 brancos
e somente 1 pessoa negra. Em 2018 o cenário mudou, temos na ALAP atualmente 15
brancos, 7 pardos e 2 pretos. O que impede a representatividade negra na
política? Essa pergunta merece duas respostas.
Primeiro,
do ponto de vista partidário. A esquerda, por exemplo, urgentemente deve atuar
com pautas antirracistas e não somente com pautas de classe. É dever do campo
progressista mobilizar a raça como luta política fundamental. Nesse sentido, é preciso repensar a agenda
partidária contra a precarização de candidaturas negras, visando converter as
candidaturas negras em mandatos.
Em
segundo lugar, o que vivemos no Brasil de fato, é uma real crise de representatividade
étnico-racial. Quem vota e cria leis no nosso país é a raça dominante: os
brancos. Isso em virtude do racismo estrutural que penetra todas camadas da
vida social. O racismo não é algo que se ver somente nos xingamentos e
humilhações, mas também podemos ver na política. A política precisa passar por
uma revolução que seja dos negros pelos negros.
Referências
ALMEIDA,
Silvio Luiz de. Racismo estrural / Silvio Luiz de Almeida – (Feminismos
Plurais / coordenação de Djamila Ribeiro) – São Paulo: Pólen, 2019.
PINHEIRO-MACHADO,
Rosana. Amanhã vai ser maior: o que aconteceu com o Brasil e as
possíveis rotas de fuga para a crise atual / Rosana Pinheiro-Machado – São
Paulo: Planeta do Brasil.
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